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Garimpo ilegal e criminalidade organizada na Amazônia: os desafios da advocacia na defesa de garimpeiros e mineradores.

  • Foto do escritor: Felipe Xavier
    Felipe Xavier
  • 9 de abr.
  • 3 min de leitura

Um recente relatório do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), divulgado em abril de 2025, trouxe à tona uma realidade cada vez mais presente nos escritórios de advocacia que atuam na defesa de mineradores e garimpeiros da Amazônia Legal: a crescente conexão entre o garimpo ilegal, o crime organizado e diversas outras atividades ilícitas, como tráfico de drogas, exploração sexual e lavagem de dinheiro. No centro dessa rede complexa de ilegalidades, estão muitos dos clientes que procuram assistência jurídica, não raro, pequenos garimpeiros, donos de equipamentos, operadores locais ou empresários que atuam em zonas de fronteira legal.

Garimpo ilegal e criminalidade organizada na Amazônia
Imagem extraída da matéria: Brasil sofre com conexão entre crimes florestais, tráfico e mineração, diz agência. Rio Tapajós, na Amazônia. A mineração em terras indígenas cresceu 625% entre 2011 e 2021, no Brasil.

O documento aponta que a mineração em terras indígenas aumentou 625% entre 2011 e 2021, sendo a Terra Indígena Yanomami um dos principais focos da atividade ilegal. Ali, segundo a ONU, organizações criminosas como o Primeiro Comando da Capital (PCC) já operam diretamente, usando a estrutura da mineração como meio de escoamento de mercúrio, lavagem de capitais e controle territorial. A consequência disso é que, na prática, boa parte dos investigados e denunciados por crimes ambientais passaram a ser alvos de ações penais extremamente amplas, que envolvem também imputações por organização criminosa, crimes contra a administração pública, tráfico de bens minerais e lavagem de dinheiro.


Para o advogado criminalista e ambiental que atua na defesa de pessoas envolvidas com o garimpo, esse cenário representa um desafio técnico de grandes proporções. É preciso lidar com operações integradas da Polícia Federal, Ministério Público Federal, IBAMA, FUNAI e Forças Armadas, que usualmente resultam em processos complexos, com elementos de inteligência, interceptações telefônicas e provas técnicas extraídas de georreferenciamento e imagens de satélite. Em muitos casos, os réus são acusados de integrarem redes organizadas, mesmo quando sua atuação se limita ao transporte de combustível, à operação de balsas ou à extração em pequena escala.


O primeiro desafio da advocacia nesse contexto é a defesa técnica pautada na individualização da conduta. Em um ambiente altamente politizado e pressionado por discursos midiáticos punitivistas, é essencial lembrar que o princípio da responsabilidade penal subjetiva continua sendo um pilar do Estado de Direito. A generalização de condutas e a criminalização em bloco de comunidades garimpeiras não podem substituir a análise criteriosa de provas, licenças, registros e vínculos reais entre os envolvidos.


Outro ponto relevante é a necessidade de conhecer profundamente o direito minerário e ambiental. Muitos casos envolvem áreas com histórico de permissões de lavra garimpeira, licenças vencidas, requerimentos em tramitação ou ocupações tradicionais. A ausência de regularização fundiária ou a inércia do Estado em responder pedidos administrativos não pode, por si só, justificar a criminalização automática de quem atua na região. É nesse espaço de legalidade suspensa que surgem importantes teses defensivas, como o erro de proibição inevitável, a boa-fé objetiva, a ausência de dolo específico, além da atipicidade material da conduta diante da inexistência de danos concretos ao meio ambiente.


O advogado que atua nesses casos também precisa estar atento à possibilidade de negociação de acordos de não persecução penal, previstos na Lei nº 9.605/98 e regulamentados por resoluções do CNMP. Tais instrumentos, se bem utilizados, podem garantir a reparação do dano e evitar a imposição de penas privativas de liberdade em contextos de menor gravidade.


Importante destacar que a defesa de garimpeiros ou mineradores não deve ser confundida com o endosso à destruição ambiental. O papel da advocacia, nesses casos, é garantir que os réus sejam julgados por seus atos e não por um estigma coletivo, muitas vezes alimentado por uma retórica que criminaliza indistintamente quem vive da atividade garimpeira. Trata-se, na verdade, de defender o devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa e o direito de ser julgado com base na prova dos autos e não na pressão da opinião pública.


Diante de um cenário cada vez mais complexo, com normas ambientais rígidas, fiscalização reforçada e conexões reais ou presumidas com o crime organizado, a advocacia especializada tem o papel essencial de equilibrar o sistema de justiça, resgatando a dimensão humana, econômica e jurídica de cada processo. Em um país onde milhares de famílias ainda dependem do garimpo para sobreviver, criminalizar em massa não é justiça. A resposta a esse desafio exige mais do que repressão: exige conhecimento técnico, atuação ética e compromisso com o Estado Democrático de Direito.

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Felipe Eduardo de Amorim Xavier - OAB/MT 16.524
Cuiabá - Mato Grosso
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